Eu sempre acreditei que perdoar fosse coisa de duas mãos. Que era necessário pedido de um lado e a dação de outro. Cresci com esse protocolo arraizado em mim. Alguém pede, alguém dá. Pronto. Tá perdoado. Nao vale se não for assim. Tipo regra de esconde esconde sabe? Quem bate cara não pode olhar, do mesmo jeito que pra ter perdão, tem que ter bilateralidade. Uma coisa não existe sem a outra. Se no esconde esconde quem olha bate cara de novo, nessa coisa antropológica de perdoar, se um dos lados não concorda com o contrato não tem perdão. Simples e pesado.
Mas perdão não é assim. Gracias a Dios.
Basta que eu peça , mesmo que o outro se recuse. Vale ainda o contrário, vale mesmo se eu pedir e o outro não der. Quando eu era pequena e aprontava alguma coisa (e eu sempre aprontava alguma coisa) minha mãe que já morreu (por que tenho uma viva - eu tenho duas) sempre dizia que eu tava perdoada.
Minha irmã, que boa pessoa já não era desde as fraldas dizia: Mas mãe, ela nem pediu desculpa!
Mamãe se limitava a dizer que eu tava perdoada e pronto.
É claro que a gente quase não entende nada quando é pequena, se fosse assim não haveria tempo pra brincar. Eu achava o máximo que a minhã mãe fosse assim. Eu fazia o diabo e ela perdoava. Perdoava e perdoava e perdoava mais. Quase nunca eu pedi desculpas, e as poucas vezes que pedi foi por nítida ameça de perder alguma regalia infantil: não fui sincera.
Cresci num lar onde havia perdão dado, doado, sem pedido. E por mais que eu me tente, não tenho a grandeza da minha mãe.
Não sei perdoar todo mundo. Não guardo a mágoa, isso não. Mas também não perdoo.
Mas ó, nao é de todo mal, pedir desculpa eu sei. E como sei. Peço desculpa sem problema, sem orgulho, sem medo de nao ser perdoada.
E todo esse texto foi só por que lembrei da minha mãe.
Que me perdoava sempre e tanto e mais.