Quando eu tinha uns 6 anos, ganhei meu primeiro papael no teatro:
Uma árvore.
Sim, mas não era uma árvore qualquer. Era uma senhora árvore. Imagivem vocês, meus queridos leitores: O tronco era uma caia de papelão pintada de marrom, que nós mesmos, crianças de 6 anos, pintamos nas aulas de Ed. Artística. (viva a criatividade das tias e o projeto pedagógico!). As folhas eram feitas de papel crepom verde, muito papel crepom verde. Na minha cabeça botaram uma cesta com maças.Na verdade não sei de quem foi essa brilhante idéia. Será que maças só nascem no topo das árvores? Aham? Enfim. Naquela época eu não era tão questionadora, graças a Deus.
Ocorre que depois de muito ensaiar e as tias convocarem TOOOOOOOOOOODAS as mães e pais e primos e avós de todo mundo, minha rinite resolveu atacar. Sim, por que eu tenho rinite desde que me conheço por gente. Não deu outra. Fiquei famossérrima. Conhecida como a árvore que espirrava. Espirrei, espirrei e espirrei durante toda a peça. Acho que foi a coisa mais difícil que eu fiz na vida. Espirrar sem perder todo aquele crepom verde, digo, folhas. Tomar cuidado pra toda água que descia nariz abaixo não borrar a caixa de papelão marrom. Um horror.
Claro que as outras crianças de 6 anos acharam o máximo desde então me apontar e dizer "olha a árvore que espirra" e morrer de rir. Muito agradável.
Pedi, implorei, chorei e fiz o maior drama pra minha mãe me trocar de colégio, afinal, ser reconhecida pelas mães dos meus milhões de amiguinhos de 6 anos como a árvore que espirrava era um motivo de força maior. Mas ela se mostrou absolutamente insensível com o e´pisódio e me manteve no Leopoldinho III - Nós educamos seu filho com amor. Mentira. Lá eles criam monstros infantis que vão rir de você por toda a sua vida.
Anos mais tarde, já no terceiro ano do ensino médio, fui convocada pro papel de freira no Colégio São José, religioso até o último fio de cabelo de São Palloti (Santo fundador do troço). Eu estudava lá como bolsista, não teve como negar pra madre superiora. Até contei o episódio da árvore que espirrava mas ela disse que era bobagem, que eu era nova demais e que meu papel só teriam duas falas.
Fui lá com todo meu trauma.
A roupa da freira era uma espécie de pano de cortina branco, com um pano de cortina preto por cima, o que me levou a fazer certa comparação sobre a falta de investimentos em figurino e cenário, que anos mais cedo eu tinha notado no Leopoldinho. Tinha um óculos também. Não sei por que raios de motivo além de freira eu tinha que usar óculos. Era castigo demais pra um ser só. Mas fui forte e não fiz objeção quando a moça me deu aquele negócio com cara de "eu já passei em muitos narizes".
Pois bem.
Falei pra moça que estava nos vestindo que achava melhor colocar um short por baixo, vai que o pano de cortina rasga né? Ela disse que era bobagem (igualzinha a madre havia dito), que o figurino já tinha sido usado milhares de vezes (olha que maralhinha, como o óculos!) e que nunca aconteceu nada.
No dia da apresentação o Colégio tava cheio, era dia do tal São Palloti e todas as carolas mães de alunos estavam por lá, elas e as família quatrocentonas de São Bernando do Campo.
Adivinha o que aconteceu?
Tropecei no pano de cortina, na parte branca e cai no palco. Não bastasse a vergonha pelo tombo, metade da minha bunda apareceu (leiam acima: Eu havia pedido pra ficar de short!) por que o pano de cortina subiu. Encerrei a minha gloriosa carreira teatral sob os olhares chocados das velhinhas da platéia.
Era melhor ser uma árvore que espirrava do que uma freira de bunda de fora.